quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

pinheiros de Natal

Na escola primária multiplicam-se composições com o tema 'o que é o Natal?'. Eu cá gosto do Natal. O que não interessa para nada, convenhamos, a pergunta quer apenas saber o que é o Natal e não o que eu acho acerca do Natal. Assumo com humildade que não sei nada do que vai nas cabeças das outras pessoas. Objectivamente, o Natal é a soma daquilo que todas as pessoas pensam acerca do Natal. Por isso a resposta à pergunta o que é o Natal é fácil: não sei. Talvez a professora tenha incorrido no erro comum de deixar incompleta uma pergunta que se julga subentendida: em composições vindouras, faça por adequar o enunciado à exequibilidade.

Para mim, Europeu confesso, o Natal é frio, neve, pinheiros, lojas enfeitadas, iluminação, nascimento de Jesus. A um carioca, tirem o frio e a neve. A um etíope, tirem as lojas enfeitadas, a iluminação. A um indígena pagão tirem o nascimento de Jesus e ponham o solstício de Inverno. No meio disto, fica a teimosia do pinheiro. De formas várias, há pinheiros em todos os continentes, a árvore é uma praga. Professora, afinal sei a resposta: o Natal são pinheiros (o Natal pode ser quando um homem quiser somente pela evidência dos pinheiros serem árvores de folha persistente).

No país do pequeno Carlitos, criança reguila, aconteceu pois um episódio curioso. Por volta de Fevereiro, os pinheiros começaram a murchar. Secaram e caíram sem causa aparente. O pânico instalou-se, não por causa dos perigos que a falta de pinheiros podem causar num ecossistema biológico, mas porque nesse país deixaria de haver Natal. O conselho de ministros reuniu-se em torno do ministro líder. Dias de negociação levaram à arquitectura de um plano. Os pinheiros naturais tinham que ser obrigatoriamente substituídos. Um apelo foi feito à nação, só um aumento de impostos extraordinário poderia tornar exequível o resgate do Natal. Foi referendada a pergunta, 'Deseja salvar o Natal?'. O sim ganhou.

Todo o plástico que o país conseguia produzir ou importar foi canalizado para a criação de pinheiros artificiais. Criteriosamente, foram colocados onde antes se erguiam, perdoem-me o abuso de linguagem, pinheiros de carne e osso. Por volta de Novembro, já ninguém se lembrava do que era resina, pinhas a cair ou o chilrear de pássaros em ninhos. O Natal estava salvo, mesmo que agora não houvesse, naquele país, plástico ou dinheiro disponível para as estrelas, bolas, e outros enfeites coloridos.

Por volta de Janeiro, sentado no baloiço do parque da cidade, o pequeno Carlitos, criança reguila, mastigava pastilha elástica enquanto brincava com o indicador dentro do próprio nariz. Viu homens com químicos a aleijar os pinheiros. Não compreendeu porque é que o faziam, sendo as árvores tão bonitas e saudáveis. Meses mais tarde, quando os exemplares a fingir foram plantados, o Carlitos achou prontamente que as pessoas que viu naquele dia eram keynesianos vestidos de fato-de-macaco. Mas eram somente os funcionários da empresa de plástico daquele país, alguns dos quais até ministros.

Sem comentários:

Enviar um comentário