quinta-feira, 30 de junho de 2011

and now for something completely different (IX)

Afinal, cisma o Coelho, a vida é fácil. Colaborava desde sempre com um mágico de idade avançada. Colaboração é falar em jeito simpático, claro, aos olhos vermelhos do Coelho o mágico era o papalvo que o carregava e lhe saciava as necessidades vitais. Todas as tardes a rotina cumpria-se com o escrúpulo de já nem ser rotina, ser o próprio viver: metia-se dentro de um saco preto e deslocava-se dessa forma camuflada para ninguém saber que ia emprestar magnificência ás modestas ruas por onde passava. Do saco, o papalvo punha-o rapidamente numa cartola. Depois, a cartola ficava numa mesa, e ao sinal que já conhecia, o Coelho saltava para fora num gesto de uma singularidade a vacilar entre a elegância e a rispidez. À volta dele, palmas. Palmas. O Coelho pavoneia-se durante uns tantos segundos na mesa, aos olhos incrédulos da multidão que atravessou desertos para o ver. 'Eles amam-me' ou 'Agradeçam a graça da minha presença', pensava o Coelho enquanto balouçava de nariz empinado ao compasso da ostentação. Choviam moedas aos seus pés e o Coelho sabia fazer parte do processo de escravatura do papalvo recolhe-las e ficar com elas. Depois, ao segundo sinal, o Coelho voltava para o saco, sempre duvidando se o seu esplendor caberia naquele curto pedaço de pano preto. O Coelho acha que a vida fácil. Eu acho que é tudo uma ilusão.

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