quarta-feira, 13 de outubro de 2010

o teste

Fecho os olhos.

Já não consigo ouvir por mais tempo as máquinas e as alfaias lá fora a trabalhar sob o comando do abrasador Sol de Agosto.

O ruído de fora entrou, entrou-me e bloqueia qualquer pensamento que possa querer nascer.

Fecho os olhos para não ouvir.

Deitada num pequeno sofá verde aveludado e quente, ainda me lembro da minha vó contar a história do sofá chegado das Índias pelo meu tio-avô Cândido que enviuvou cedo, infurtúnio da vida,e de logo se entregou à família sobrante.

Fecho os olhos.

Não desejo estar aqui. É o barulho já disse, que me convida a sair.

Os primeiros segundos de penumbra assustam-me. Também não quero estar aqui.

Abro os olhos. Barulho de novo. Não.

Tento de novo o teletransporte da alma e mente para outro lugar, abandonando o corpo naquela sala onde coexistem apenas sofá e barulho. Sim, já nem eu me sinto na sala.

Começo a passear por memórias para assim encontrar o caminho das vontades e ir dar à praça do desejo e do sonho.

Passo por um lindo bosque, o cheiro a terra molhada hidrata-me o rosto que há muito sente os arranhos da vida que passa.

Esta sensação de frescura levou-me a continuar, penetro cada vez mais por entre os braços das árvores.

Subitamente, sinto sob os meus pés um tapete diferente. Se a suavidade e o toque terno que recebia do chão me tinham acompanhado até ali, a dureza dava-me agora as mãos.

Sou atacada pela frieza de um chão de pedra, duro, muito duro. Olho em frente e nada mais vejo se não um longo traço branco que se estende e toca o céu.

Era o tapete de pedra.

Segui, apesar do frio que sentia, dos pés subiu até mim, aquela rasto deixado por alguém ou algo. Estremeço com o frio, agora reconfortava o sofá do tio-avô Cândido, ao chegar defronte de um grande portão.

Só de o olhar senti o seu peso. De ferro era ele, velho, comido, de pose altiva e soberana sobre o traço branco que acabara de percorrer. E sobre mim mesma também.

Empregando toda a minha força sobre a argola do portão, um guincho de dor vindo das dobradiças faz-me arrepiar de novo.

Olho em frente e algo vejo.

Doze grande colunas, quais gigantes de contos infantis,se erguiam do chão e se esperguiçavam de forma sensual até ao céu.

Sobre estas seus capitéis enfeitavam-lhes o cabelo. E sobre estes ainda, repousando serenamente, um frontão recortado, adornado com a mestria de homens cuja beleza queriam atingir.

Por detrás deste conjunto, divinamente agrupado e conjugado, estava

uma porta, pesada também pelo que vi, desta vez de madeira.

Sem lhe chegar, sem lhe tocar, sem a sentir, senti que ali, por detrás da sua imponência, não ia encontrar ruído, máquinas, calor, aveludado ou verde sequer.

Ali ia encontrar o sítio pelo qual meu corpo buscou mas que apenas a minha mente atingiu.

Deixo-me então no sofá para caminhar em direcção à grande porta.

Não sei o seu nome. Não sei para onde me leva.

Mas sei que me convida a entrar.



(Texto escrito sob os olhos de uma imagem representativa de um tempo da Antiguidade Clássica para um teste de diagnóstico de Teoria da Arquitectura. A sua publicação foi decidida Sábado à noite numa conversa animada com a Mariana e o Fernando. A culpa é deles que me tentaram a publicar este texto que me fez duvidar da minha sanidade mental depois de pensar que tinha escrito o acima exposto num teste de faculdade...)

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